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A fabricação de um cientista social
Texto proferido no I Ciclo de debates - Cientista Sociais: Memória, Profissão e Organização Sindical no Ceará. dia 26/09/2012
Mesa: Mercado de trabalho e a profissão do Cientista Social
Autor: Pedro Jorge Chaves Mourão (Mestre em Sociologia - UFC)
Nada mais em processo de formação do que um pós-graduando.
Porque além de aluno ele deve ser também um professor.
A fabricação de um cientista social
Texto proferido no I Ciclo de debates - Cientista Sociais: Memória, Profissão e Organização Sindical no Ceará. dia 26/09/2012
Mesa: Mercado de trabalho e a profissão do Cientista Social
Autor: Pedro Jorge Chaves Mourão (Mestre em Sociologia - UFC)
Nada mais em processo de formação do que um pós-graduando.
Porque além de aluno ele deve ser também um professor.
Gostaria de começar minha fala fazendo um relato de como
foi a minha formação como cientista social.
Eu estudava em uma escola do bairro que não chegava a ser
a mais cara, mas também não chegava a ser a uma escola pública. Minha mãe
queria para mim um futuro melhor do que ela teve então fazia um sacrifício ou
outro para me manter nessa escola. Acredito que naquela época eu já havia
ouvido falar em sociologia, antropologia ou ciência política. Mas infelizmente
não me lembro onde. No vestibular, escolhi algo que tivesse a ver com as
matérias que eu era bom.
Historia e geografia eram as que eu mais gostava, principalmente a geógrafia que falava sobre as condições de vida das pessoas e a história que não era tão antiga para não ter nada em comum com o que eu vivia. Algo me disse que a faculdade certa para mim era ciências sociais porque o nome lembrava a disciplina de Estudos Sociais que tive no primário. No começo da faculdade eu estudava com muito orgulho todos os livros da bibliografia. Eu queria mostrar serviço e fazia todas as tarefas de casa. Aos poucos fui percebendo algo estranho na faculdade, todos falavam muito e liam muito, mas a palavra “social” parecia mais como uma placa na porta da coordenação, ou como a estampa de uma blusa de estudante.
Historia e geografia eram as que eu mais gostava, principalmente a geógrafia que falava sobre as condições de vida das pessoas e a história que não era tão antiga para não ter nada em comum com o que eu vivia. Algo me disse que a faculdade certa para mim era ciências sociais porque o nome lembrava a disciplina de Estudos Sociais que tive no primário. No começo da faculdade eu estudava com muito orgulho todos os livros da bibliografia. Eu queria mostrar serviço e fazia todas as tarefas de casa. Aos poucos fui percebendo algo estranho na faculdade, todos falavam muito e liam muito, mas a palavra “social” parecia mais como uma placa na porta da coordenação, ou como a estampa de uma blusa de estudante.
Logo comecei a me perguntar como seria minha vida depois
da faculdade, que emprego eu iria ter e o que eu iria fazer. Perguntei aos meus
colegas que estavam se formando aonde eles estavam trabalhando, ou onde
pretendiam trabalhar e cada vez que eu perguntava alguns faziam uma cara de
ofendidos e outros falavam em fazer pesquisas, escrever artigos e livros. A
maioria deles hoje conseguiu empregos em outras áreas fazendo outras coisas e
nunca terminaram aquela pesquisa que queria fazer.
As vezes eu perguntava para os professores se havia
alguma pesquisa que eu pudesse participar, quando haveria alguma seleção para
ser bolsista, estágio em algum empresa ou algo parecido, e do mesmo jeito que
os colegas, alguns faziam uma cara de ofendidos e outros falavam em fazer
pesquisas, escrever artigos e livros. As seleções para bolsistas raramente vi, com
poucas exceções de panfletos que eram rapidamente arrancados dos murais por
colegas mais desesperados.
Me falaram que as ciências sociais era uma faculdade
terapêutica e que iria servir para toda minha vida mesmo que fosse para me
fazer uma pessoa melhor. Naquele momento o que me preocupava mais era pagar as
contas de água, luz e telefone. Logo percebi que as ciências sociais não era
uma faculdade para pobres. Não havia o curso noturno e eram raros os estágios,
mais ou menos 1 a cada ano e as poucas bolsas que alguns professores conseguiam
de financiamento público dificilmente não era divididas entre os
alunos mais “chegados”.
Havia disciplinas muito boas, mas nenhuma delas falava
com eu poderia usar as ciências sociais para poder sobreviver. Uma vez até
tentei montar uma empresa de pesquisa social. Mas poucos de nos sabíamos como
fazer aquilo e os professores que sabiam não demonstravam interesse em ensinar.
Nas disciplinas de licenciatura, notei algo interessante, que os professores
que queriam nos ensinar a ser professores, nunca tinham sido professores de
ensino médio. Então como alguém que nunca ensinou em ensino médio poderia em
ensinar a lidar com esse cotidiano?
A didática é diferente, o conteúdo é outro, os métodos pedagógicos são outros.
E onde deveríamos aprender a prática, nos ensinavam a teoria, e quando nos ensinavam a teoria chegava o sono, pois faltava didática.
Depois percebi que não era culpa dos professores, hoje vejo que a lógica da universidade e a lógica de mercado de trabalho dificilmente permitiam que um cientista social pudesse transitar nesses dois mundos ao mesmo tempo. A prova maior foi quando notei que quase nenhum professor meu poderia me encaminhar para alguma vaga de trabalho, porque eles mesmos não conheciam nenhum posto de trabalho para um cientista social... fora o posto que eles já ocupavam na Universidade.
A didática é diferente, o conteúdo é outro, os métodos pedagógicos são outros.
E onde deveríamos aprender a prática, nos ensinavam a teoria, e quando nos ensinavam a teoria chegava o sono, pois faltava didática.
Depois percebi que não era culpa dos professores, hoje vejo que a lógica da universidade e a lógica de mercado de trabalho dificilmente permitiam que um cientista social pudesse transitar nesses dois mundos ao mesmo tempo. A prova maior foi quando notei que quase nenhum professor meu poderia me encaminhar para alguma vaga de trabalho, porque eles mesmos não conheciam nenhum posto de trabalho para um cientista social... fora o posto que eles já ocupavam na Universidade.
Logo percebi os possíveis caminhos que poderia ter dentro
das Ciências Sociais.
1) Me tornar professor no ensino médio trabalhar de segunda as sexta em diversos colégios e ganhar aproximadamente 2mil reais. Esse dinheiro provavelmente não iria gastar porque estaria ocupado demais corrigindo provas ou cansado pela maratona de peregrinação de escola em escola. Mas antes para dar aula em alguma escola eu precisaria ter algum “amigo” que me indicasse para dar aula, e se possível alguns anos de experiência em docência ou passar no concurso do Estado.
2) Ou como bacharel eu poderia ser pesquisador em alguma ONG trabalhando por temporadas, e de projeto em projeto com sorte conseguir pagar as contas ou em um órgão do Estado. Mas para isso além de precisar da indicação de algum amigo e experiência eu ia precisar ser no mínimo mestre ou doutor porque a esses locais raramente dariam chance para um graduado ao invés de um pós-graduado.
Uma opção era a pós graduação, então eu
tentei. Havia o boato que só quem passava eram os indicados pelos professores.
Juntei dinheiro, larguei meu estágio na prefeitura onde antes haviam me dito
que eu iria aprender mais sobre minha profissão, mas na verdade passei um ano
consertando computadores velhos. Aproveitei o dinheiro que juntei e em casa sem
sair para nenhum canto por 6 meses fiquei estudando para a seleção. Fiz a seleção de
dois mestrados e passei nos dois. De fato, os aprovados não eram só escolhidos
por afinidade, mas também pelo mérito das provas e do projeto de pesquisa que
escreveram.
Todos me parabenizaram, mas eu nunca consegui parar de pensar nós outros colegas que ficaram no meio do caminho. Aos poucos, eu vi, da minha turma de 50 colegas esperançosos se formarem 9 (até a minha última contagem) e desses 9, 3 foram fazer mestrado, os outros estão dando aula em escolas do estado ou privadas e provavelmente tem uma segunda fonte de renda para viver. Dos outros 41 tive poucas notícias, os que puderam pagar faculdades privadas foram para cursos que tem vazam para o mercado (jornalismo, direito, etc). Mas, a maioria deles não teve essa sorte. Já na seleção do mestrado vi 140 outros colegas tentarem sem êxito. Hoje me pergunto se existem vagas suficientes para todos nós como professores da UFC e da UECE. Acho que não. Alguém pode dizer, “mas os concursos públicos?”. Tudo bem que quando eu era criança nunca pensei que iria ser cientista social, mas arrisco a dizer que quase ninguém quer ser formar em Ciências Sociais para se técnico administrativo em uma repartição pública. A maioria quer trabalhar na área. Mas onde estão nossas vagas? Não estão, foram cortadas por que os políticos acham que a cunhada deles que é especialista em Astrologia pode muito bem orientar um projeto de política pública. Para eles dá no mesmo.
Todos me parabenizaram, mas eu nunca consegui parar de pensar nós outros colegas que ficaram no meio do caminho. Aos poucos, eu vi, da minha turma de 50 colegas esperançosos se formarem 9 (até a minha última contagem) e desses 9, 3 foram fazer mestrado, os outros estão dando aula em escolas do estado ou privadas e provavelmente tem uma segunda fonte de renda para viver. Dos outros 41 tive poucas notícias, os que puderam pagar faculdades privadas foram para cursos que tem vazam para o mercado (jornalismo, direito, etc). Mas, a maioria deles não teve essa sorte. Já na seleção do mestrado vi 140 outros colegas tentarem sem êxito. Hoje me pergunto se existem vagas suficientes para todos nós como professores da UFC e da UECE. Acho que não. Alguém pode dizer, “mas os concursos públicos?”. Tudo bem que quando eu era criança nunca pensei que iria ser cientista social, mas arrisco a dizer que quase ninguém quer ser formar em Ciências Sociais para se técnico administrativo em uma repartição pública. A maioria quer trabalhar na área. Mas onde estão nossas vagas? Não estão, foram cortadas por que os políticos acham que a cunhada deles que é especialista em Astrologia pode muito bem orientar um projeto de política pública. Para eles dá no mesmo.
Eu tenho a ligeira impressão de que a
maioria das pessoas não sabe a diferença entre um filósofo, um astrólogo, um
sociólogo e um analista...
Se queremos resolver e não só discutir
os problemas das ciências sociais temos que tecer uma crítica endereçada a nós.
As Ciências Sociais erram quando acharam
que o "distanciamento" das influências sociais ia nós dar a
imparcialidade.
As Ciências Sociais erram quando
forçaram seus estudantes a não pensarem nos problemas sociais e sim nos
problemas sociológicos.
As Ciências Sociais erraram quando não
se preocuparam em explicar para o povo para que servia aquelas pesquisas que
tanto a gente dizia que estava fazendo.
As Ciências Sociais erraram em não se
preocupar em dar a visibilidade necessária para o resultado dos seus trabalhos,
deixando para a crítica roedora dos ratos.
As Ciências Sociais erraram quando só
trabalharam a teoria e esqueceram a aplicabilidade do que criaram.
As Ciências Sociais ERRARAM quando foram
narcisistas quando só ficaram olhando para seu próprio umbigo coberto de artigos
e livros ao invés de si mostrar para a sociedade e dizer para ela quais eram
seus objetivos concretos.
O resultado é que hoje todos os que
bebem das ciências sociais (jornalistas, administradores, assistentes sociais,
arquitetos, urbanistas, advogados, turismólogos etc). Eles sabem muito bem para que ela
serve. Mas infelizmente o povo ainda não sabe que as ciências sociais servem
principalmente para prender ou libertar as pessoas....mesmo que sejam nós
mesmos.
Excelente reflexão!
ResponderExcluirSou professora de Ensino Médio..me formei com as mesmas angústias q vc ...meus alunos perguntam pq me formei em ciências sociais. Não era minha escolha inicial, mas hj vejo q foi acertada...meus vencimentos são poucos, como o de qq professor q se preze no país, mas tento fazer do meu trabalaho um instrumento de orientação aos meus alunos p/ q se tornem mais humanos e menos mercenários capitalistas. gostei muito de ler sua crítica reflexiva...Seu caminho será encontrado no momento oportuno..SUCESSO. Márcia.
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