Ubiracy de Souza Braga*
_____________________
* Sociólogo (UFF), cientista político (UFRJ), doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará.
“Eu,
com 9 anos, conheci um moço sem saber que era Luiz Gonzaga, no Hotel Tavares
Gouveia”. Dominguinhos
Escólio:
José Domingos de Morais nasceu em Garanhuns, no dia 12 de fevereiro de 1941 e
faleceu em São Paulo, em 23 de julho de 2013. Conhecido como Dominguinhos, foi
um instrumentista, cantor e compositor brasileiro. Exímio sanfoneiro teve como
mestres nomes como Luiz Gonzaga e Orlando Silveira. Na região Nordeste do Brasil,
o acordeão é popularmente denominado sanfona, embora este termo designe
originalmente um instrumento musical de cordas muito tensas, similar à rabeca.Em
sua formação musical, Dominguinhosrecebeu influências do baião, bossa nova,
choro, forró, xote e jazz.Em 1950, aos nove anos de idade, conheceu Luiz
Gonzaga quando tocava na porta do hotel em que este estava hospedado. Luiz
Gonzaga se impressionou com a desenvoltura do menino e o convidou a ir ao Rio
de Janeiro.A sua integração à equipe de músicos de Luís Gonzaga fez com que
ganhasse reputação como músico e arranjador e ele aproximou-se de músicos do
movimento bossa nova. Fez trabalhos junto a inúmeros músicos de renome, como
Gilberto Gil, Maria Bethânia, Elba Ramalho e
Toquinho, e eventualmente acabou por consolidar uma carreira musical própria,
englobando gêneros musicais diversos como bossa nova, jazz e pop.
Desnecessário dizer que a “Bossa
Nova” é considerada um subgênero musical, antropologicamente falando, derivado
do samba e com forte influência do jazz estadunidense, surgido no final da
década de 1950 no Rio de Janeiro. De início, o termo era apenas relativo a um
novo “modo de cantar” e “tocar samba” naquela época, ou seja, a uma
reformulação “estética dentro do moderno samba carioca urbano”. Com o passar
dos anos, a Bossa Nova tornar-se-ia um dos movimentos mais influentes da
história cultural da música popular brasileira, conhecido em todo o mundo e,
especialmente, associado a João Gilberto, Nara Leão, Vinicius de Moraes,
Antônio Carlos Jobim, Baden Powell e Luiz Bonfá e outros.A palavra “bossa”
apareceu pela primeira vez na década de 1930, em “Coisas Novas”, samba do
popular cantor Noel Rosa: O samba, a prontidão/e outras bossas,/são nossas
coisas (...). A expressão bossa nova passou a ser utilizado também na década
seguinte para aqueles “sambas de breque”, baseado no talento de improvisar
paradas súbitas durante a música para encaixar falas.
Alguns
críticos musicais destacam certa influência que a cultura norte-americana do
Pós-Guerra, de músicos como Stan Kenton, combinada ao impressionismo erudito,
de Debussy e Ravel, teve na bossa nova, especialmente do cool jazz e bebop.
Embora tenha pouca influência de música estrangeira como o Jazz, a Bossa Nova
possui elementos de samba sincopado. Além disso, havia um fundamental
inconformismo com o formato musical de época. Os cantores Dick Farney e Lúcio
Alves, que fizeram sucesso nos anos da década de 1950 com um jeito suave e
minimalista (em oposição a cantores de grande potência sonora) também são
considerados influências positivas sobre os garotos que fizeram a Bossa Nova.
Um embrião do movimento, já na década de 1950, eram as reuniões casuais, frutos
de encontros de um grupo de músicos da classe média carioca em apartamentos da
zona sul, como o de Nara Leão, na Avenida Atlântica, em Copacabana. Nestes
encontros, cada vez mais frequentes, a partir de 1957, um grupo se reunia para
fazer e ouvir música. Dentre os participantes estavam novos compositores da
música brasileira, como Billy Blanco, Carlos Lyra, Roberto Menescal e Sérgio
Ricardo, entre outros. O grupo foi aumentando, abraçando também Chico Feitosa,
João Gilberto, Luiz Carlos Vinhas, Ronaldo Bôscoli, entre outros.
Luiz
Gonzaga do Nascimento nasceu numa sexta-feira no dia 13 de dezembro de 1912,
numa casa de barro batido na Fazenda Caiçara, povoado do Araripe, a 12 km de
Exu (extremo oeste do estado de Pernambuco, a 610 km do Recife, a 69 km de
Crato e a 80 km de Juazeiro do Norte, (Ceará), segundo filho de Ana Batista de
Jesus (‘Mãe Santana’) e oitavo de Januário José dos Santos. O padre José
Fernandes de Medeiros o batizou na matriz de Exu em 5 de janeiro de 1913. Deveria
ter o mesmo nome do pai, mas na madrugada em que nasceu seu pai foi para o
terreiro da casa, viu uma estrela cadente e mudou de ideia. Era o dia de São
Luís Gonzaga no mês do Natal, o que explica a adoção do sobrenome Nascimento. O
lugar natal é no sopé da Serra do Araripe, e inspiraria uma de suas primeiras
composições, “Pé de Serra”. Seu pai trabalhava na roça, num latifúndio, e nas
horas vagas tocava acordeão; também consertava o instrumento. Foi na década de
1940 que o baião tornou-se popular, através dos músicos Luiz Gonzaga (conhecido
como o “rei do baião”) e Humberto Teixeira (“o doutor do baião”). O baião
utiliza muito os seguintes instrumentos musicais: viola caipira, sanfona,
triângulo, flauta doce e acordeom. Os sons destes instrumentos são intercalados
ao canto. A temática do baião é o cotidiano dos nordestinos e as dificuldades
da vida. O baião recebeu, na sua origem, influências das modas de viola, música
caipira e também de danças indígenas.
Reportagem
do Diário de Pernambuco (1957).
Foi
com ele que Luiz aprendeu a tocá-lo. Não era adolescente ainda quando passou a
se apresentar em bailes, forrós e feiras, de início acompanhando seu pai.
Autêntico representante da cultura nordestina manteve-se fiel às suas origens
mesmo seguindo carreira musical no sudeste do Brasil. O gênero musical que o
consagrou foi o baião. A canção emblemática de sua carreira foi “Asa Branca”,
composta em 1947 em parceria com o advogado cearense Humberto Teixeira. Antes
dos dezoito anos Luiz teve sua primeira paixão: Nazarena, uma moça da região.
Foi rejeitado pelo pai dela, o coronel Raimundo Deolindo, que não o queria para
genro e ameaçou-o de morte. Mesmo assim Luiz e Nazarena namoraram algum tempo
escondidos e planejavam o futuro. Januário e Santana lhe deram uma surra ao
descobrirem que ele se envolveu com a moça. Revoltado por não poder casar-se
com a moça, e por não querer morrer nas mãos do pai dela, Luiz Gonzaga fugiu de
casa e ingressou no exército no Crato (Ceará). Durante nove anos viajou por
vários estados brasileiros, como soldado, sem dar notícias à família. Não teve
mais nenhuma namorada.
Dominguinhos interessou-se
por música desde cedo, começando a aprender sanfona com seis anos de idade,
quando ganhou um pequeno acordeão de oito baixos e chegou a se apresentar em
feiras livres e portas de hotéis em troca de algum dinheiro junto com seus dois
irmãos, com quem formava o trio Os Três
Pingüins.Oriundo de família humilde, seu pai, mestre Chicão, era um
conhecido sanfoneiro e afinador de sanfonas. Disciplinado, praticava o
instrumento por horas a fio, e logo se tornou proficiente nas sanfonas de 48, 80 e 120 baixos, e acabou “por
tornar-se músico profissional ainda garoto”. Em 1950, aos nove anos de idade,
conheceu Luiz Gonzaga quando tocava na porta do hotel em que este estava
hospedado. Luiz Gonzaga (foto) se impressionou com a desenvoltura do menino e o
convidou a ir ao Rio de Janeiro. Foi no dia 13 de dezembro de 1956, durante a
comemoração do aniversário do Rei do Baião.Dominguinhos o fez em 1954, então
com treze anos de idade, acompanhado do pai e dos dois irmãos, indo morar no
município de Nilópolis, no estado do Rio de Janeiro, berço doGrêmio Recreativo
Escola de Samba Beija-Flor, Baixada Fluminense. Por vezes é chamada
informalmente de Beija-Flor de Nilópolis, numa referência à sua cidade de
origem, porém esta denominação não é oficial. Dominguinhos
tinha apenas 16 anos quando Luiz Gonzaga o apresentou como seu herdeiro
musical.
Ao
encontrar-se com Luiz Gonzaga no Rio (foto), este lhe deu de presente uma
sanfona e o integrou à sua equipe de músicos, e Dominguinhos passou a fazer
shows pelo Brasil e participar de gravações. Em uma dessas viagens, em 1967,
conhece a cantora de forró Anastácia, nome artístico de Lucinete Ferreira, com
quem se casa e forma uma parceria artística que duraria onze anos. Dominguinhos
já tinha um filho, Mauro, nascido em 1960 de seu primeiro casamento. Em 1976,
Dominguinhos conhece a também cantora Guadalupe Mendonça, seu terceiro
casamento, do qual nasceria uma filha, Liv. Separaram-se, mas mesmo após a
separação, os dois mantiveram a amizade até a morte do cantor. A sua integração
à equipe de músicos de Luís Gonzaga fez com que ganhasse reputação como músico
e arranjador e ele aproximou-se de músicos do movimento bossa nova(cf. Braga,
2012). Fez trabalhos junto a inúmeros músicos de renome, como Gilberto Gil,
Maria Bethânia, Elba Ramalho e Toquinho, e eventualmente acabou por consolidar
uma carreira musical própria, englobando gêneros musicais diversos como bossa
nova, jazz e pop.
Em
primeiro lugar do ponto de vista técnico-metodológico, o acordeão, também
chamado sanfona e gaita, é um instrumento musical aerofone de origem alemã,
composto por um fole, um diapasão e duas caixas harmónicas de madeira.
“Acordeão” e a corruptela acordeom
vêm do alemão akkordium, pelo
francês accordéon. Já “Sanfona” vem
do grego symphonía, pelo latim symphonia e pelo latim vulgar sumphonia. Na história social da música
o cheng é “o precursor do harmônio e
do acordeão, pois foi o primeiro a ser idealizado e construído na família dos
instrumentos de palheta”. De acordo com a região que era usada, o cheng recebia nomes diferentes: “schonofouye”,
“hounofouye”, “tcheng”, “cheng”, “khen”, “tamkim”, “yu”, “tchao” e “ho”. De
acordo com o padre jesuíta Amiot, o cheng
foi levado da China para São Petersburgo, na Rússia, onde Kratzenstein, na
verdade ChristienTheophile, doutor em filosofia, em medicina e professor da
Faculdade de Medicina da Universidade de Copenhague, nascido em Wernigerode, na
Prússia, em 1723, examinou o instrumento e verificou “que o seu agente sonoro
era uma lâmina de metal que vibrava por meio do sopro, produzindo sons graves e
agudos”.
Em
seguida ele sugeriu que Kirschnik aplicasse, nos tubos dos órgãos de sua
fabricação, esta lâmina livre de metal, o que foi feito em 1780. Da Rússia, passou
para a Europa, tendo a Alemanha tomado grande interesse, sobretudo nos
instrumentos de órgão. Foi daí que ChristienFriederich Ludwig Buschmann,
fabricante de instrumentos, teve a ideia de reunir várias lâminas afinadas e
fixadas numa placa formando uma escala cujos sons se faziam ouvir passando
rapidamente através do sopro, isto em 1822. Mais tarde, ele transformou esta
pequena placa num instrumento musical para brinquedo de criança, tocado com as
duas mãos, ao qual deu o nome de “handaolina” ou “harmônica de mão”. Para
tanto, aumentou o número de palhetas de metal e o tamanho do aparelho,
anexando- lhe um pequeno fole e uma série de botões. Este instrumento, depois,
segundo a história, foi aperfeiçoado por Koechel e, 7 anos mais tarde, o
austríaco Cirilo Demian construiu, em Viena, um instrumento rudimentar de
palheta livre, teclado e fole, ao qual, em virtude de ter 4 botões na parte da
mão esquerda que, ao serem tocados com os dedos afundados, “permitiam a
obtenção do acorde, deu o nome de acordeão, nome que ficou
definitivamente ligado ao instrumento através de inúmeros aperfeiçoamentos”.
Historicamente
o sistema de palheta livre já havia sido aperfeiçoado por Grenié em 1810, na
França, sendo rico em sonoridade e dando origem ao órgão. O francês Pinsonat
empregou o mesmo sistema no alamiré ou diapasão tubular que veio a chamar-se “tipófono”
ou “tipótono” e do qual se originou a gaita de boca, cuja invenção se deve a
Eschenbach. A gaita de boca é um conjunto de palhetas metálicas como linguetas,
dispostas cada uma em seu caixilho e vibradas pelo ar soprado pela boca. Na
França, o acordeão foi aperfeiçoado em 1837 por C. Buffet. Segundo todos os
tratados sobre o assunto, o acordeão nada mais é do que o aperfeiçoamento de diversos
instrumentos do mesmo gênero, como o “oeline de Eschenbach”, o “aerophone de
Christian Dietz”, “a physarmónica de Hackel” etc., tomando, desde esta data,
sua forma definitiva, seu desenvolvimento concreto mais rico e seus variados
registros para mudança de intensidade e timbre do som.
Mais
tarde, com a escala cromática, o acordeão pôde produzir qualquer melodia ou
harmonia e inúmeros fabricantes o aperfeiçoaram colocando registros, tanto na
mão direita com na esquerda, para maior variedade de sons. Contudo, vale
lembrar que é na Itália que se fabricam os melhores acordeões, tendo sido os
primeiros construídos em 1863 em Castelfidardo, em Ancona, surgindo depois
Paolo Soprani e Stradella-Dellapé. Nos Estados Unidos, há diversas fábricas,
sendo a marca Excelsior a mais famosa. Na Alemanha, foi construído o primeiro
acordeão em 1822, em Berlim. Vem desse país a marca Hohner.No Brasil, também
tiveram grande destaque os acordeões Todeschini, da cidade de Bento Gonçalves,
no Rio Grande do Sul. Mesmo com uma interrupção na fabricação de mais de 30
anos, os acordeões desta marca continuam tendo preferência nacional por ter um
som inconfundível. Ao longo de sua história, a Todeschini produziu mais de 170
000 acordeões. A qualidade dos produtos era tão grande que a Todeschini passou
a fabricar acordeões para a marca Hohner. Estes eram exportados para os Estados
Unidos.
Ainda
no Brasil, uma família importante na história do Acordeon são os Bertussi.
Através da sua música de grande qualidade, os Irmãos Bertussi (Adelar e
Honeide), eram consultados para dar suas opiniões na confecção dos Acordeons
Todeschini. É possível conhecer esta história através do memorial localizado no
Rio Grande do Sul, onde se encontra aberto à visitação pública, anexo tem a
casa histórica da família Bertussi. Os “Irmãos Bertussi” marcaram a época na
música Brasileira a partir de 1955, porém a saga desta família Italiana
atravessa todo o século XX na música do Rio Grande do Sul, iniciando-se com a
chegada de João Bertussi Filho (pai de FioravanteBertussi) na leva de imigrantes
XIX. Estabelecidos na região serrana, “Os Bertussi” difundiram instrumentos
musicais (especialmente a gaita) através de seu entreposto comercial. Criaram
uma escola musical baseada na técnica apurada e na leitura musical.
Talvez
a cultura gaúcha nem possa dimensionar ainda a influência e real importância
dos “Bertussi”, mas, eles representam diretamente a ascendência Italiana na
sociedade gaúcha do século XX e todos os seus significados. “Os Bertussi”
infundem uma escola musical de baile, com música apropriada para a dança e a
alegria característica do povo Italiano.Somando a isso, ainda há que se frisar
o aspecto importante do espírito inovador destes músicos.A primeira grande
revolução que causaram foi a de utilizar dois acordeons ao invés da costumeira
dupla violão/acordeom.Isto só foi possível, porque Adelar e Honeide eram
exímios instrumentistas e escreviam as partituras rearranjando os temas de modo
que os instrumentos se completassem. Era como um só acordeom tocando a quatro
mãos. Anos depois, já no início dos anos 1950, Incorporaram a bateria ao baile
gaúcho.
Bateria
era, então, um instrumento utilizado pelos jazzistas e havia entrado no Rio
Grande do Sul a partir de 1924. “Os Bertussi” sabiam o que queriam.Na época não
existiam equipamentos de som: microfones, amplificadores e caixas de som são
coisas dos anos 1960. Precisavam de volume, de potência sonora para os bailes
cada vez maiores. Assim é que “Os Bertussi” estiveram na linha de frente da
música ao gravar temas eruditos em acordeom para o mercado nacional e ao
revolucionar a execução musical dentro do estado. Esta saga vitoriosa cruza
todo o século XX e adentra o século XXI.Adelar e seu irmão foram os pioneiros
da música tradicionalista gaúcha, e também foi o primeiro grupo a incluir a bateria
em bailes, fato inédito, porque na época os artistas se apresentavam nos bailes
com um pandeiro, uma gaita, um violão e um bumbo legüero.Hoje Adelar
apresenta-se em shows pelo Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Na
véspera de viajar para Exu, a fim de participar das comemorações pelo
centenário de Luiz Gonzaga, Dominguinhos foi tomado de uma imensa angústia.
Estava debilitado, depois de mais uma sessão de quimioterapia. Estava chorando
quando chamou a mulher, a cantora Guadalupe, para conversar. Ela lhe disse que
ele podia celebrar Luiz Gonzaga no show que aconteceria no Parque Dona Lindu,
não precisava fazer a cansativa viagem ao sertão, de carro, já que
Dominguinhos, há anos, não viaja de avião: “Eu disse que ele não podia ir. Ele
teimou e foi dois dias antes, como se temesse ficar impossibilitado de ir. Acho
que ele sabia que ia ter consequência. Porém criaram muita expectativa em torno
dele, como principal herdeiro de Luiz Gonzaga. Ele pagou pra ver, e o preço foi
alto”. O comentário é da cantora Guadalupe Mendonça, que convive com
Dominguinhos há 37 anos, e com quem teve a também cantora Liv Moraes. Ela e
Dominguinhos se casaram, e se separaram, mas amizade continuou. Ela e a filha
acompanham o drama do artista muito antes de se tornar público que ele estava
acometido de um câncer no pulmão: “Diziam que ele não duraria seis meses, e já
se passaram seis meses. A gente, eu e Liv, acompanhava, monitorando de longe.
Quando viajava, eles ligavam pelo menos quatro vezes por dia. Mas não tem sido fácil.
Passei a tomar antidepressivo”, revela Guadalupe.
Os
dois se conheceram no Rio, no final dos anos 1970, mas Guadalupe confessa “que
se apaixonou por Dominguinhos a primeira vez que o viu no palco”, num show de
Nara Leão: “Eu estava prestes a sair do Brasil, tinha sido contratada por um
produtor inglês para dançar no Molin
Rouge, em Paris. Mas quando começou o show, uma das músicas foi Folhetim,
que não havia ainda sido gravada, comecei a chorar. Comecei a me dizer que não
podia sair do Brasil, que precisava daquilo. Quando terminou o show sai
correndo feito uma louca para o camarim. Queria falar com. Pedi para me
apresentaram o sanfoneiro”. A facilidade de chegar ao camarim, porque ele foi
com o tio, o ator Luiz Mendonça, e quem produzia o show era o pernambucano
Wellington Lima, na época então casado com Xuruca Pacheco, prima de Guadalupe.
A primeira vez que ela viu Dominguinhos foi a Fazenda Nova, ainda adolescente.
Ele tinha ido participar do primeiro festival de verão que aconteceu no teatro
ao ar livre. Dominguinhos na época tocava com Gal Costa: “Os melhores momentos
da minha vida aconteceram em Fazenda Nova. Comecei a fazer a Paixão de Cristo com quatro anos de
idade”, conta Guadalupe (foto).
Foi
o avô dela, Epaminondas Mendonça, líder político da região, que iniciou, com
sua mulher, Sebastiana Mendonça, a Paixão
de Cristo, em 1951. O filho dele, Luiz Mendonça, “foi o primeiro Cristo na
encenação do drama sacro”. Mesmo com antecedentes na família, o pai de
Guadalupe, o deputado Paulo Lucena de Mendonça, proibiu a filha de seguir a
carreira artística: - “Sofri violência doméstica. Meu pai me proibia de pensar,
de viver”, confessa Guadalupe. Mas não adiantou. No Recife, ela começou a
participar de programas no Canal 2 (atual TV Jornal). Quando se tornou
impossível continuar cantando, pelas imposições do pai, Guadalupe conta que,
com 18 anos, fugiu para São Paulo: - “Conheci Marcio Fasano, quando ele veio ao
Recife com a peça:“Computa, computador, computa”, de Millôr Fernandes. Fiquei
hospedada na casa dos avós dele em São Paulo. Trabalhei como modelo, participei
do musical:“Onde canta o sabiá”, com direção de Tânia Alves”, conta Guadalupe.
Tânia Alves participou do grupo “Chegança, de Luiz Mendonça”.
De
São Paulo ela foi para o Rio, morar na casa de Luiz Mendonça, ator com carreira
estabelecida, e que incentivava a sobrinha: - “Comecei a ganhar dinheiro
fazendo fotonovelas, tinha muito naquele tempo, Contigo, Capricho, Sétimo Céu.
Minha tia, Diva, mandou uma carta para Daniel Filho, e passei a fazer pontas em
novelas da rede Globo. A primeira de que participei foi Dancing days”. E aí veio o show com Dominguinhos e Nara Leão: - “Sai
andando pelos corredores do teatro e, de repente, lá vem Dominguinhos
caminhando em minha direção. Só nós dois. Ele perguntou se eu tinha gostado do
show. Disse que estava apaixonada por ele. Fui para São Paulo, e não parava de
pensar em Dominguinhos. Quando voltei para o Rio, encontrei por acaso, diante
do Teatro Carlos Gomes, o zabumbeiro que tocava com ele. Mandei um beijo para
Dominguinhos”.
O
estado de coma do cantor, compositor e sanfoneiro pernambucano Dominguinhos é
irreversível, segundo o filho dele, Mauro da Silva Moraes. Mauro confirmou,
nesta sexta-feira, 17/07 que recebeu a informação do médico Paulo Marchiori, do
Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, no dia 25 de fevereiro. A família vinha
mantendo a informação em sigilo, mas o filho resolveu falar. A família diz que
retardou a divulgação da notícia para preservar o compositor. – “O médico me
disse pessoalmente que o coma é irreversível. Estávamos tentando resguardar,
estou respeitando muito meu pai, mas tem uma hora que você não aguenta”, disse
Mauro, filho do primeiro casamento do músico. Os dedos de Seu Domingos se movem
lentamente. Há meses estavam duros, em nada parecidos com aqueles que a diva do
jazz Sara Vaughan beijou depois de vê-los incendiar as teclas de uma sanfona no
Free Jazz Festival de 1987.
Nem
de longe os mesmos que Luiz Gonzaga nomeou herdeiros legítimos de seu reinado.
Ao sentir a mão da mulher Guadalupe (2013) tocar a sua, Dominguinhos a aperta
forte. Sua reação mais comovente depois de oito enfartes, 23 minutos sem
oxigenação no cérebro, uma traqueostomia, dois meses na UTI e desavenças familiares
sobre seu próprio leito até parece milagre.A luta do maior músico da cultura
nordestina, um dos mais geniais instrumentistas do País, se dá em um quarto do
Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Assim que foi diagnosticado com um câncer
de pulmão, fez tratamentos de rádio e quimioterapia sem jamais falar sobre a
doença com a imprensa. Sua incapacidade de dizer não, mesmo debilitado, o
levou, em dezembro de 2012, até Exu, no interior de Pernambuco, para tocar nos
100 anos de nascimento de Luiz Gonzaga. Uma decisão difícil, tomada depois de
uma noite de lágrimas como respostas às súplicas de Guadalupe. – “Eu dizia para
ele não ir e ele só chorava. Ele nunca diz não”.
Como
não entra em avião “nem sob tortura”, Dominguinhos saiu de carro de Recife para
Exu. A cada dois quilômetros, ligava para dizer a Guadalupe como estava. Em uma
ligação, reclamou de febre. – “Então volta, homem. Volta pelo amor de Deus”,
ela implorou. Domingos foi até o fim e tocou já sentindo o pulmão fechar.
Quatro dias depois, passou mal, foi internado e começou a lutar pela vida. Três
rapazes chegaram quarta-feira do Recife só para ver Dominguinhos. Era um sonho
conhecer o mestre. Guadalupe aceitou levá-los até o quarto. Enquanto Domingos dormia,
ela contava sobre o dia em que o “trouxe de volta”. Guadalupe implorava para
que o marido saísse de seu estado de inconsciência. – “Domingos, acorde. Sei
que você está me ouvindo. Venha comigo homem, você consegue. Pegue nas mãos
desse homem de branco a seu lado e venha...”. De repente, nas lembranças de
Guadalupe, o sanfoneiro levou o tronco para frente e ergueu os braços. Quando
tentou falar, percebeu que não podia e, então, sua expressão foi de pânico.
Guadalupe
contava esta história quando percebeu que os rapazes não olhavam surpresos mais
para ela, mas para Dominguinhos. Seu Domingos, notou a mulher, estava acordado
e chorando. – “Ele ouviu o que eu disse e se emocionou”. Ela não chamou os médicos,
só confortou o paciente. - “Não desista,
não deixe o que aconteceu hoje abalar você”. Antes dos três fãs chegarem do
Recife para beijarem suas mãos, uma cena triste vivida sobre seu leito pela
segunda vez deixou Dominguinhos visivelmente triste.Quem passou pelo hospital
foi Mauro Moraes, filho do sanfoneiro e de Janete, sua primeira mulher. Mauro,
53 anos, não tem boas relações nem com Guadalupe, a segunda esposa de Domingos,
nem com Liv, a filha do casal. Segundo testemunhas, Mauro chegou para visitar o
pai quando se desentendeu com Márcio, o acompanhante que Guadalupe contratou
para ficar o tempo todo ao lado de Dominguinhos. Mauro pediu para ficar a sós
com o pai, mas Márcio se negou a deixar o quarto. Mauro então teria começado
uma discussão acalorada com Márcio, pedindo privacidade e dizendo que ninguém
teria o direito de fazer aquilo com ele. O clima esquentou e impropérios foram
trocados.
Guadalupe
não gosta de alimentar discussões, mas diz estar exausta das desavenças
provocadas por Mauro. Em março, sites publicaram frases do rapaz dizendo que seu
pai estava “em coma irreversível”, informação nunca confirmada pelo hospital.
Dias depois, redes sociais multiplicavam o boato de que Dominguinhos havia
morrido. – “Você imagina as pessoas me ligando dizendo que meu pai morreu”,
conta Liv. “Quando disse que ele estava em coma irreversível, só repeti o que
um médico disse para mim”. O Sírio Libanês não dá notícias que vão além de um
boletim divulgado em 18 de março: - “Houve melhora do quadro cardiológico,
respiratório e renal. Do ponto de vista neurológico, ele apresenta estado
minimamente consciente, demonstrando discretos sinais de recuperação. O
paciente permanece internado, sem previsão de alta”. O coração de José Domingos de Moraes, 72 anos,
“tem o tamanho do mundo e segue batendo no ritmo de um xote doído e comovente...”.
O
cantor e compositor pernambucano Dominguinhos, conhecido como “rei da sanfona”,
morreu às 18h, aos 72 anos, em decorrência de complicações infecciosas e
cardíacas. Ele estava internado no hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Pouco
depois da morte, vários artistas se manifestaram para lamentar a perda do
músico.A cantora Ivete Sangalo postou no Instagram
uma foto “em que aparece ao lado do sanfoneiro”. Na legenda, escreveu: - “Vá em
paz, Dominguinhos. Sentirei saudade do seu sorriso, mas você é maravilhoso e
nos deixou a sua música”. Chico Buarque
disse: “Muito triste. Perdi um amigo e um parceiro querido”. Também pelo Instagram, a cantora Roberta Miranda
disse: “Minha homenagem ao nosso querido Dominguinhos!! Tive o prazer de
homenagear com a música “Forrepeando”. Ele tocou sua linda Sanfona e sorriu
muito na frase (mas pra tocar este fole com tanto carinho, tem que ser
Dominguinhos ) #triste”.
A
cantora Elba Ramalho postou: “Lá se vai, o meu amor, deixando uma grande
saudade... Dominguinhos, eterno amor, amizade sincera!!”. Gal Costa postou “uma
foto antiga ao lado do sanfoneiro” em sua conta no Instagram com a frase: “Saudades de Dominguinhos. Muita mesmo!”. O
cantor Luciano, da dupla Zezé di Camargo e Luciano, postou uma foto com a
legenda: “Descanse em paz, meu grande amigo”.Integrante da dupla Cesar Menotti
e Fabiano,Cesar Menotti lamentou: “O povo triste e a cultura nacional
infinitamente mais pobre. O Sanfoneiro Ouro partiu. #luto”. O apresentador
Britto Jr. disse: “Meus sentimentos à família de Dominguinhos. O bailão não tem
hora pra terminar lá no céu!”.O cantor Luan Santana escreveu: “Aonde quer que
você vá Seja onde for Me leva, Me leva... Seja como for seu mundo Se você me
leva eu vou...”. Deus levou um dos maiores nomes da história da nossa música!
Descanse em paz Dominguinhos!”. O apresentador Rafael Cortez disse no Twitter: “Triste a morte de
Dominguinhos. Mas me contento em saber q ele agora reencontra amigos saudosos
no outro lado, onde chega amparado e querido”.
A
cantora Preta Gil postou uma foto do cantor no Instagram com a mensagem: “Mestre dos mestres Dominguinhos,
descanse em Paz!! #saudade". O cantor Falcão também se manifestou:
"#Tristeza Partiu Dominguinhos. Vá com Deus, amigo!”. O cantor China
escreveu no Twitter: “agora que o
forró no céu vai ficar bom! voa, dominguinhos... voa!”. Paula Lima, cantora,
disse: “Dominguinhos: Genialidade, Musicalidade, Serenidade, Elegância e
Brasilidade! #DescanseEmPazDominguinhos”.O compositor de axé Tonho Matéria
disse no Twitter: Mais um gênio se
vai e deixa sua marca na mente do povo nordestino. #Adeus meu caro e amado
mestre #Dominguinhos!". A cantora Karina Buhr postou: “DOMINGUINHOS,
preciosidade dessa vida!! E das outras vidas...”. O cantorTatau da banda
Araketu disse: - “Uma grande perda para a música brasileira! Descanse em paz
Dominguinhos... “Sempre terá o meu respeito e admiração”.
Entre os prêmios recentes que recebeu por sua obra, em 2002, foi vencedor do Grammy Latino com o disco “Chegando de
Mansinho”. Em 2007, ganhou o prêmio TIM na categoria Melhor Cantor Regional
pelo álbum: “Conterrâneos” (2006) e no ano de 2010 foi homenageado no Prêmio Shell de Música Brasileira, recebendo a
premiação pelo conjunto da obra. Bibliografia geral consultada:
BRAGA, Ubiracy de
Souza, “Etta James: At Last. Ensaio
de Etnomusicologia”. Disponível no site: http://estudosviquianos.blogspot.com.br/2012/03/; Idem, “Forró:
Dança, rebolado, beleza e internacionalização do gênero”. Disponível em: http://httpestudosviquianosblogspotcom.dihitt.com/n/arte-cultura/2012/05/29/; Idem, “Jorge Ben
Jor, 70 anos do Poeta da Simpatia”. Disponível no site: http://www.oreconcavo.com.br/2012/05/17; Idem, “Gilberto
Gil, fruto de uma geração luminosa”. Disponível em: http://www.oreconcavo.com.br/2012/06/29/; Idem, “Há 50 Anos o
Mundo (en) Canta Garota de Ipanema”.
Disponível no site: http://estudosviquianos.blogspot.com.br/2012/03/; Idem, “Jorge
Mautner: memória do filho do caos”. Disponível em: http://www.oreconcavo.com.br/2013/02/06/; CANTEL, Raymond, Les Prophetiesdanslalitteraturepopulaire du
Nordeste. Caravelle. /Toulouse, (15), 1970; GUSDORF, George, La Palabra. Buenos Aires: Ediciones
Nueva Visión, 1971; HEGEL, G. W. F., Fenomenologia
delloSpirito. Florença: La Nuova Itália, 1973, 2 volumes; Idem, “A
Fenomenologia do Espírito” (Excerto). In: Os
Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1980;ENZENSBERGER, Hans Magnus, Palaver - PolitischeÜberlegungen
(1967-1973).EditionSuhrkampVerlag Frankfurt amMain 1974;GERBER, Raquel, O Mito da Civilização Atlântica - Glauber
Rocha e o cinema Novo, cinema e sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1978; Artigo:“Dominguinhos, herdeiro fiel”. Disponível no site: http://www.millarch.org/artigo/; Luiz Gonzaga: Vozes do Brasil. São
Paulo: Martin Claret, 1990; Ângelo, Assis, Eu
Vou Contar pra Vocês. São Paulo: Ícone, 1990;MORIN, Edgar, La complexitéhumaine. Paris: ÉditionsFlammarion,
1994;AZEVEDO, Antônio Carlos do Amaral, Dicionário
de nomes, termos e conceitos históricos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1996; Dominique,Vida do Viajante: A saga
de Luiz Gonzaga. 2ª ed. São Paulo: Editora
34, 1997; EIZING, Barbara; VELOSO, Caetano, Tropical
Truth: A Story of Music and Revolution in Brazil.Nova York: Da Capo
Press, 2003; VENTURA, Thiago,MPB completa
20 anos sem Luiz Gonzaga (2009); BECKER, Howard S., Falando da Sociedade. Rio de Janeiro: Zahar, 2009; Artigo: “Guadalupe
conta sua história com Dominguinhos”. Disponível no site: http://jconline.ne10.uol.com.br//2013/04/01/; Artigo: “Veja e
leia reportagem de 1957 em que Luiz Gonzaga apresenta Dominguinhos como seu
sucessor”. Disponível em: http://blogs.diariodepernambuco.com.br/play/; Artigo: “Sereno
adeus a Dominguinhos, o discípulo maior de Gonzagão”. In: Fortaleza: Diário do
Nordeste, 24 de julho de 2013, entre outros.
O hotel em que Dominguinhos (que ainda era conhecido como "Neném do acordeon") encontrou Luiz Gonzaga pela primeira vez, chamava-se "Tavares Correia" (não "Gouveia") e ainda existe em Garanhuns.
ResponderExcluirPaulo Simões (editor da Wikipédia)