Origem, Memória e Significado das Humanidades no Ceará.
Ubiracy de Souza Braga*
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* Sociólogo (UFF), cientista político (UFRJ), doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Hamlet Meu pai... Como que o vejo aqui, meu
pai. – Horácio: Onde, senhor? - Hamlet:“Nos olhos da memória”. William
Shakespeare, Hamlet. Ato I, Cena II
(2011).
Centro de Humanidades, Universidade
Estadual do Ceará, Av. Luciano Carneiro, 335, bairro de Fátima, Fortaleza.
Em torno do governador
Manoel Inácio de Sampaio, por volta de 1813 a 1817, reuniam-se poetas que
formavam os “Oiteiros”. A estética desse tempo era o Neoclassicismo, ou
Arcadismo, e entre esses versejadores estavam Pacheco Espinosa, Costa Barros,
Castro e Silva, e outros. Pelo fato de se terem guardado apenas textos de
louvor ao governante, afinal, eram manuscritos que estavam no Palácio de
governo, Silvio Júlio, em Terra e povo
do Ceará (1936), disse horrores desses poetas. Mas Dolor Barreira,
principalmente em sua História da
literatura cearense (1948), compreendeu que, bem ou mal, os versos dos
Oiteiros “representavam o alvorecer das letras em nossa Província”. Depois de
um período um tanto incaracterístico, no que toca a estilos literários, veio
Juvenal Galeno, em 1856, comPréludios
poéticos, já românticos e com motivos do povo, o que viria com mais força
em seu livro principal, Lendas e canções
populares (1865), aparecido no mesmo ano em que, no Rio de Janeiro, José de
Alencar publicava Iracemaque
simbolizaria as terras alencarinas. Do
ponto de vista da memória, objeto de nossa reflexão, a“Padaria espiritual”
(1892 - 1898) foi tida por seus integrantes como uma Agremiação de Rapazes e
Letras, e foi fundado em 30 de maio de 1892 em Fortaleza, nascida em um famoso
quiosque da Praça do Ferreira, de 1892 em Fortaleza, o Café Java. Antônio
Sales, idealizador e o responsável principal pela originalidade da agremiação,
junto a Lopes Filho, Ulisses Bezerra, Sabino Batista, Álvaro Martins Temístocles
Machado e Tibúrcio de Freitas compunham o grupo dos que frequentavam o Café
Java e dos Fundadores da Agremiação. Tinham por influência grandes nomes da
literatura nacional e mundial. A cada domingo, um jornalzinho de oito páginas
chamado “O Pão” era “amassado” e fez circular 36 números, até que em dezembro
de 1898, depois de 6 anos de atividades, a Padaria fecha. Os títulos dos
membros desta Academia “seguiam o padrão usado nas padarias reais”, do ponto de
vista do processo de trabalho (Marx). Vejamos o que nos diz a pena do cantor,
compositor e instrumentista Beto Guedes, membro do Clube de Esquina mineiro: “Sim,
todo amor é sagrado/E o fruto do trabalho/É mais que sagrado/Meu amor/A massa
que faz o pão/Vale a luz do teu suor/Lembra que o sono é sagrado/E alimenta de
horizontes/O tempo acordado de viver” (cf. Beto Guedes, “Amor de Índio”, 1978).
Escólio:
A Universidade Estadual do Ceará(UECE) é uma universidade pública mantida pela
FUNECE - Fundação Universidade Estadual do Ceará, atualmente com mais de 23 mil
alunos em todo o estado. É uma das maiores universidades do Ceará.É considerada
a oitava melhor instituição estadual de ensino superior do Brasil e a primeira
entre suas similares do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, de acordo com pesquisa
realizada pelo Instituto Datafolha,em 2012.Também é a única universidade
brasileira citada no “Bright Green Book” (Livro Verde do Século XXI), uma
parceria entre o EUBRA – Conselho Euro-Brasileiro de Desenvolvimento
Sustentável e a ONU-Habitat, o programa de assentamentos urbanos da Organização
das Nações Unidas. Em 2012 a universidade ofereceu 2.205 vagas para 67 cursos
de graduação para o período 2013.Criada com o objetivo de atender às
necessidades de formação de
professores da rede de ensino do Estado do Ceará, a Universidade Estadual do
Ceará estruturou uma rede “multi-campi” em vários municípios do estado com
Faculdades nos Municípios de Crato, Juazeiro do Norte, Iguatu, Quixadá,
Limoeiro do Norte, Crateús, Ipu, Ubajara, Redenção e Cedro.
Foto: O cotidiano de professores, funcionários e alunos no Centro de Humanidades da UECE (2013).
A
vida cotidiana (cf. Heller, 1972; 1975; 1982a; 1982b) é a vida de todo homem,
pois não há quem esteja fora dela, seja o culto e o inculto e do homem todo, na
medida em que, nela, são postos em funcionamento todos os seus sentidos, as
capacidades intelectuais e manipulativas, sentimentos e paixões, ideiase
ideologias. Em outras palavras, é a vida do indivíduo e o indivíduo é sempre
ser particular e ser genérico, por exemplo, as pessoas trabalham - uma
atividade do gênero humano -, mas com motivações particulares; têm sentimentos
e paixões -manifestações humanas egenéricas -, mas os manifestam de modo
particular, referido ao eu e a serviço da satisfação de necessidades e da
teleologia individuais; a individualidade contém, portanto, a particularidade e
a genericidade ou o humano-genérico. Abstraída de seus determinantes sociais,
toda vida cotidiana é heterogênea e hierárquica tanto quanto ao conteúdo e à
importância atribuída às atividades, espontânea, no sentido de que, nela, as
ações se dão automática e irrefletidamente, econômica, uma vez que, nela,
pensamento e ação manifestam-se e funcionam somente na medida em que são
indispensáveis à continuação da cotidianidade; portanto, as ideias necessárias
à cotidianidade jamais se elevam ao nível da teoria, assim como a ação cotidiana
não é práxis, baseia-se em juízos provisórios, é probabilística e recorre à ultra
generalização e à imitação. É nesse marco que Heller teoriza sobre o pensamento
e o trabalho, a ciência e a arte, os contatos interpessoais e a personalidade.
Todas
essastendências são consideradas por Agnes Heller formas necessárias do
pensamento e da ação na vida cotidiana; sem elas, seria impossível até mesmo a
sobrevivência. No entanto, quando se cristalizam em absolutos, não deixando ao
indivíduo margem de movimento e de possibilidade de explicitação, estamos
diante da alienação da vida cotidiana. Pela coexistência e sucessão de
atividades heterogêneas, a vida cotidiana é, de todas as esferas da realidade,
a que mais se presta à alienação. Embora terreno propício à alienação, ela não
é necessariamente alienada. Ou é em determinadas circunstâncias
histórico-sociais, como é o caso da estruturação das sociedades industriais
capitalistas. Nessas sociedades, o indivíduo da vida cotidiana é o indivíduo
que realiza o trabalho que lhe cabe na divisão social do trabalho, produz e
reproduz esta parte e perde de vista a dimensão humano-genérica. Assim sendo,
perde de vista as condições de sua objetividade; ao alienar-se, torna-se
particularidade, parcialidade, indivíduo preso a um fragmento do real, à
tendência espontânea de orientar-se para seu eu particular.
Dizer
que a vida cotidiana é propícia ao preconceito, que a base antropológica dele é
a particularidade e seu componente afetivo é a fé não significa afirmar que os
sistemas de preconceitos sociais decorrem dos preconceitos do homem tomado
isoladamente. A maioria de nossos preconceitos tem, na verdade, um caráter
mediata ou imediatamente social: os assimilamos e os aplicamos, através de
mediações, a casos concretos. A particularidade do homem está vinculada a
sistemas de preconceitos pelo fato de que na sociedade predominam “sistemas de
preconceitos sociais estereotipados e estereótipos de comportamentos carregados
de preconceitos”. Em outras palavras, embora a vida cotidiana seja propícia à
emergência de preconceitos, ela não os determina; sua origem deve ser procurada
em outro lugar. Segundo Heller, os preconceitos têm a função de consolidar e
manter a estabilidade e a coesão de integrações sociais, principalmente das
classes sociais. Essa função de mantenedor da estabilidade e da coesão só é
desempenhada quando estas estão internamente ameaçadas. Por isso, a maior parte
dos preconceitos é produto das frações das classes dominantes, pois é a elas
que interessa manter a coesão de uma
estrutura social, conseguida em parte graças à mobilização, através de
preconceitos, dos que representam interesses diversos ou até mesmo heterogêneos
e antagônicos. Apoiadas no conservadorismo, no comodismo, no conformismo ou nos
interesses imediatos dos integrantes das classes ou camadas sociais que lhes
são antagônicas, as classes dominantes conseguem mobilizá-las contra os
interesses de sua própria classe e contra a práxis, mas que não poderemos
tratar agora.
Defendemos
a tese segundo a qual o curso de Ciências Sociais pertence ao Centro de
Humanidades desde a sua criação (cf. Jaeger, 1962; 1994).Seu deslocamento
recente para o prédio do Centro de Estudos Sociais Aplicados, já estava sendo
premeditado acerca de 2 anos no campus do bairro Itaperi, e se explica em
função do egoísmo autoritário, se já não é um truísmo, de alguns professores
oportunistas que tendo as suas atividades ligadas a Laboratórios,muitas vezes em
detrimento das salas de aula, afinal de contas ensinar é um dom, forçaram em
nome do coletivo de professores a ida onde se aloja o centro de poder da
universidade – a Reitoria. Para concordarmos com o velho e bom antropólogoLucienLévy-Bruhl
em 1922: “avant toutechose, soulignonsunparadoxequitraversetoutel’oeuvreetpeut-êtreladépasselargement.
L’expression ´mentalitéprimitive`dont, onvient de leconstater, il ne revendiqueabsolumentpaslapaternité,
est cependantirrémédiablementassociée à sonnom”.
O
curso de Ciências Sociais, do Centro de Humanidades (CH), passa a funcionar, a
partir deste semestre, no Campus do Itaperi, com base no Bloco R. Neste bloco
situa-se o Centro de Estudos Sociais
Aplicados o que já configura a dinâmica epigramática positivista de corte
comteano constringindo a liberdade de expressão.Atualmente o CH tem como
Diretora a professora Dra. Letícia Adriana Pires dos Santos (foto), oriunda do
Departamento de Letras e o Vice-Diretor, professor Dr. Eduardo Jorge Oliveira Triandópolis
(foto), oriundo do Departamento de Filosofia. A Coordenadora do curso de Ciências
Sociais professora Dra. Maria Raquel de Carvalho Azevedo e a Vice Coordenadora,
professora Dra.Rosangela Maria Costa Fernandes, encaminharam-se para o campus
do Itaperi com bonomia e prestimosidade.
Caminham
os homens, na época presente, de maneira bastante duvidosa, porque a maioria
deles pretende somente aparentar, subir, galgar posições para depois abusarem
dessas posições, abusarem dos direitos que possuem, e descem, moralmente,
descem na sua honestidade, tornar-se-ão, enfim, criaturas indesejáveis. Não
adianta subir assim. É preferível nunca ter subido, é preferível manter-se na
sua posição de trabalhador social honesto, do que subir, galgar postos para
deles fazer mau uso. É uma obsessão que vem dominando os seres: “a do mando”,
ou do luxo, da riqueza, do quererem aquilo que os outros possuem. Invejar as
posições altas, a riqueza dos outros é estar o ser a prejudicar-se, e nada
mais. Em vez de invejarem, em vez de quererem usufruir fortuna, em vez de
quererem posições para gozarem delas, saibam aumentar o seu quinhão,
honestamente, por meio do trabalho, por meio do seu labor, do seu braço forte,
rijo, mas sempre honesto e bom.
No
Campus de Fátima, localizado na Avenida Luciano Carneiro, em Fortaleza, funciona
o Centro de Humanidades, constituído com a implantação da UECE em 1975. Este
Centro originou-se da antiga Faculdade de Filosofia do Ceará - FAFICE, que
contava com os cursos de Filosofia e Letras em funcionamento desde 1947, ano de
sua criação. Em 1966 a FAFICE foi encampada pelo Governo do Estado do Ceará e,
em 1967 transformou-se em autarquia por meio da Lei nº 8.737, de 25 de janeiro
de 1967. O primeiro diretor do CH, nomeado quando da criação da UECE foi o
Professor Luiz Moreira.Atualmente o CH que possui sete cursos de graduação,
sendo na modalidade presencial: Filosofia, Letras, Música e Psicologia e um de
Artes Plásticas, na modalidade à distância.O curso de Ciências Sociais
escafedeu-se.
O
Secretário Geral do CH, Sérgio Augusto Lima Leitão,Prefeito: Ivan Leite Braga,
Secretaria Executiva,Deborah Barbosa, permanecem no Centro de Humanidades,
assim como a eficiente secretária Suzana. A Universidade Estadual do Ceará
(UECE) festeja neste ano de 2013, os 25 anos de instalação do curso de Ciências
Sociais “in partibus infidelium”, ou, “entierra de infieles”. Por intermédio
dos professores do colegiado de Ciências Sociais prepararamuma vasta
programação entre os dias 10 e 13 de junho, constando de minicursos, mesas
redondas e o lançamento do livro:“Ciências Sociais da UECE: histórias e
memórias”, organizadas pelos professores Dr. João Bosco Feitosa dos Santos e Dr.
João Tadeu de Andrade. Segundo a coordenadora geral do Encontro, professora Dr.
AdelitaNeto Carleial, as discussões giram em torno do tema: “Política Cultura e
Sociedade: diálogos sobre a realidade social”. Toda a programação ocorreu no Auditório
do Centro de Humanidades, campus de Fátima. O curso forma profissionais aptos a
atuarem na sociedade, tradicionalmente nas áreas de Planejamento e Pesquisa,
também prepara profissionais com formação básica que os capacita ao
conhecimento da realidade social, mediante o uso dos métodos científicos
compatíveis com a evolução tecnológica atual.
Em primeiro lugar a palavra
memória origina-se do Grego “mnemis” ou do latim, “memoria”. Em ambos os casos
a palavra denota significado de conservação de uma lembrança. Trata-se de um
termo presente e utilizado por várias ciências, sobretudo nas humanidades,
sendo absorvida pelas novas correntes historiográficas. Para os gregos a
memória estava recoberta de um halo de divindade, pois se referia à “deusa
Mnemosyne”, mãe das Musas, que protegem as artes e a história. Mnemosine ou
Mnemósine, em grego: Mνημοσύνη, era
uma das Titânides, filha de Urano e Gaia e a deusa que personificava a Memória.
Era aquela que preserva do esquecimento. Seria a divindade da enumeração
vivificadora frente aos perigos da infinitude, frente aos perigos do
esquecimento que na cosmogonia grega aparece como um rio, o Lete, um rio a
cruzar a morada dos mortos, o de letal esquecimento, o Tártaro, e de onde “as
almas bebiam sua água quando estavam prestes a reencarnarem-se, e por isso esqueciam
sua existência anterior”.
Novos diretores, Letícia
& Eduardo, seu staff e a
concessão do uso de faixa de terreno para o Centro de Humanidades, que abrigará
um estacionamento e permitirá ampliação do refeitório do campus de Fátima.
Em segundo lugar, os antigos gregos
autodenominavam-se helenos, e a seu país chamavam Hélade, nunca tendo chamado
“a si mesmos” de gregos nem à sua civilização Grécia, pois ambas as palavras
são latinas, sendo-lhes atribuídas pelos romanos. Os gregos originaram-se de
povos que migraram para a península balcânica em diversas ondas migratórias,
como o início do milênio II a. C.: aqueus, jônicos, eólicos e dóricos. As
populações invasoras são em geral conhecidas como “helênicas”, pois sua
organização de clãs fundamentava-se, na crença de que descendia do herói
Heleno, filho de Deucalião e Pirra. São inúmeras as diferenças entre a Grécia
moderna e a Grécia Antiga. O mundo grego antigo estendia-se por uma área muito
maior do que o território grego atual.
No livro Paidéia (1962), uma análise da formação
do homem grego que se tornou um clássico, o intelectual alemão Werner Jaeger
(1888-1961) afirma: “No esposibledescribiren pocas palabraslaposición
revolucionaria de Greciaenla historia de laeducación humana”. O próprio termo “paidéia”, de difícil
tradução, dá uma ideia aproximada da abrangência da influência grega em nossa
vida: engloba ao mesmo tempo civilização, cultura, educação e tradição de um
povo. Muitas das ideias que ainda se discutem em vários domínios - política,
ciência e filosofia, por exemplo - são ecos do que já pensavam os gregos mais
de vinte séculos atrás. Na tradição grega mais antiga, uma aplicação possível
da proto-ideia de alegoria é o ensino dos pitagóricos, cujo sistema filosófico,
apoiado em relações numéricas simbólicas, contém associações de natureza
alegórica. Presente desde Demócrito (cf. Marx, 1974) na Grécia Clássica, a
ideia de átomo é, por excelência, uma “pré-ideia” ou “proto-ideia” que, de
tempos em tempos reaparece em novos contextos e em novos “estilos de
pensamentos”, com novas formas de interpretação da cultura. Tal acontece, por
exemplo, na doutrina do dualismo essencial entre limite e ilimitado, que se
funda na composição de dez pares de opostos, alguns alegóricos como Luz/Trevas
e Bom/Mau.
Em segundo lugar, uma das funções
mais importantes da memória é ser fonte de respostas às questões que intrigam o
ser humano - a sua origem, identidade e a sua posição e papel no mundo - por
isso é muito significativo que “Mnemosyne” esteja ligada à faculdade da
orientação e da desorientação no tempo e no espaço. Outra função importante da
Deusa Memória era a seleção das informações que seriam transmitidas, por isso
existe uma relação entre “Mnemosyne” e “Lemosyne” (esquecimento). A
sacralização da memória e sua representação como uma deusa demonstram a sua
importância social, além da sua vinculação com as Artes, a História, a
Filosofia, a Sociologiae a Ciência de modo geral, representadas pelas Musas que
não só são suas filhas mitológicas, mas que por ela são nutridas com informação,
memória e discernimento. A Memória ainda foi considerada parte da virtude da
Prudência, juntamente com a Inteligência e a Providência, por São Tomás de
Aquino, símbolo e fundamento, com a criação do curso de Filosofia da
Universidade Estadual do Ceará na década de 1950, como consta sua imagem na
sala de professores.
A palavra na cosmogonia recua ao que
não pôde ser esquecido: o primeiro sonho, a primeira visão, a primeira imagem,
“o paradigma de todo ato humano significativo”. A palavra guarda a primeira
forma de sabedoria que uma realidade verbal pôde conter, pois que, pela palavra
é possível retornar “à sabedoria primeira e eterna” nas cosmogonias. A Poética
de Aristóteles já cogitava, por exemplo, o termo “mito” como o princípio: “o
mito é o princípio e [é] como que a alma da tragédia; só depois vêm os
caracteres.”: e adiante, confirma “os mitos devem ter uma extensão bem
apreensível pela memória”. Memória para se narrar o que é extensível e para a
experiência do passado não ser esquecida, e para o tempo futuro fazer parte da
própria realidade do tempo. A memória, na tradição oral, seria “o livro” em que
se guarda o que não pode ser esquecido, e memória tem a ver com os segredos do
tempo.
Guardar os conhecimentos, os
conselhos profissionais, as normas morais, como o tesouro da verdade repostados
na sempre imprevisível palavra. A palavra é tecida nas narrativas em uma teia
nem sempre linear. Linear é o curso. Narrar é o discurso. É assim que o
detentor desse discurso conhece os segredos e os destinos da palavra. Ele
aprende a errar o curso, a criar entre as brechas da memória. E assim, no
exercício da memória, tem a fórmula da obra duradoura. Desse modo, é até bom
saber que memória e tem algo em comum com a invenção. A memória, de acordo com
a tradição grega, carrega algo de amplo “metáforas de infinitude”, assim
entendido [...] “no panteão grego, a Memória, ‘Mnemosyne’, é uma deusa, filha
de Urano e de Gaia, irmã de Chronos e de Okeanos - a memória filha do céu e da
terra, irmã do tempo e do oceano: todas, metáforas de infinitude”. Memória e
invenção, portanto, ao serem personificadas como mulheres, carregariam, na
cosmogonia grega, os poderes da conservação identificados ao comportamento
feminino. “Mnemosyne” é mãe das musas, deusas da literatura e das artes e
Calíope, segundo a tradição, é mãe de Orfeu, um dos primeiros poetas
pré-homéricos. Ao todo eram nove musas, sendo que na numerologia, o número
nove, por ser triplo de três, o número do princípio totalizador, seria o número
da perfeição. Assim, na Antiguidade, acreditava-se que a totalidade das artes e
das ciências humanas estivessepersonificada nas nove musas. As musas, filhas de
Memória e de Zeus.
Dialética, vem do grego,“é um método
de diálogo cujo foco é a contraposição e contradição de ideias” que, por assim
dizer leva a outras ideias e que tem sido um tema central na filosofia
ocidental e oriental desde os tempos antigos. A tradução literal de dialética
significa “caminho entre as ideias” (cf. Foulquié, 1966). Aos poucos, passou a
ser a arte de, no diálogo, demonstrar uma tese por meio de uma argumentação
capaz de definir e distinguir claramente os conceitos envolvidos na discussão.
Aristóteles considerava Zenão de Eleia (aprox. 490-430 a.C.) o fundador da
dialética. Outros consideraram Sócrates (469-399 a. C.). Um dos métodos
dialéticos mais conhecidos é o desenvolvido pelo filósofo alemão Hegel
(1770-1831). Além disso, o termo discurso pode também ser definido do ponto de
vista lógico.
Ou
seja, a Fenomenologia (cf. Hegel, 1973) vem a ser uma história concreta da consciência, sua saída da caverna e sua
ascensão à Ciência. Daí a analogia que
em Hegel “existe de forma coincidente entre a história da filosofia e a
história do desenvolvimento do pensamento”, mas este vir-a-ser é necessário,
como força irresistível que se manifesta lentamente através dos filósofos, que
são “instrumentos de sua manifestação”. Ipso
facto quando Hegel afirma sobre a filosofia em geral, que “a coruja de
Minerva só levanta voo ao anoitecer” (“die Eule der Minerva beginnterstmit der
einbrechendenDämmerungihrenFlug”), vale somente para uma filosofia da história,
ou seja, é verdadeiro para a história e corresponde à weltanschauung dos historiadores.Quando pretendemos significar algo
a outro é porque temos a intenção de lhe transmitir um conjunto de informações
coerentes - essa coerência é uma condição essencial para que o discurso seja
entendido. São as mesmas regras gramaticais utilizadas para dar uma estrutura
compreensível ao discurso que simultaneamente funcionam com regras lógicas para
estruturar o pensamento. Um discurso político, por exemplo, tem uma estrutura e
finalidade muito diferente do discurso econômico, mas politicamente pode operar
a dimensão econômica produzindo efeitos sociais específicos em termos de
persuasão.Aqui está nosso ponto de ligamento, do lat. ligamentu, da filosofia com a história.
Encorajado
por Hegel que percebeu depois de Kant que a filosofia só havia começado na
Grécia com Platão e Aristóteles, tal como Nietzsche mais tarde a concebera como
ponto de partida dionisíaco, posto que ambos admitissem que a polis e a glória
da história grega chegava ao seu fim ou, para Nietzsche, “a sua decadência”. O
que é primus inter pares, porém, é
que Platão e Aristóteles vieram a ser ou realizar o início da tradição
filosófica ocidental e que esse início do pensamento filosófico grego ocorreu
quando a vida política já se aproximava realmente de seu fim. Não devemos
perder de vista o que Platão chamou de dialegesthai,
Sócrates chamava de maiêutica, a “arte
do parto”: ele queria ajudar as pessoas a dar à luz os seus próprios
pensamentos, a encontrar a verdade em sua doxa.
Hoje,
a Grécia constitui um país, cujo nome oficial é República Helênica. Já a Grécia
Antiga nunca foi um estado unificado com governo único. Era um conjunto de
cidades-estados independentes entre si, com características próprias embora a
maioria das cidades-estados tivessem seus sistemas econômicos parecidos,
excluindo-se de Esparta. Os gregos tinham conflitos e diferenças entre si, mas
muitos elementos culturais em comum. Falavam a mesma língua (apesar dos
diferentes dialetos e sotaques) e tinham religião comum, que se manifestava na
crença nos mesmos deuses. Em função disso, reconheciam-se como helenos (gregos)
e chamavam de bárbaros os estrangeiros que não falavam sua língua e não tinham
seus costumes, ou seja, os povos que não pertenciam ao mundo grego (Hélade).
Um
exemplo de atividade cultural comum entre os gregos foram os Jogos Olímpicos. A
partir de 776 a. C., de quatro em quatro anos, os gregos das mais diversas
cidades reuniam-se em Olímpia “para a realização de um festival de
competições”. Esse festival ficou conhecido como Jogos Olímpicos. Os jogos
olímpicos eram realizados em honra a Zeus (o mais importante deus grego) e
incluíam provas de diversas modalidades esportivas: corrida, saltos, arremessa
de disco, lutas corporais. Além do esporte havia também competições musicais e
poéticas. Os gregos atribuíam tamanha importância a essas competições que
chegavam a interromper guerras entre cidades (trégua sagrada) para não
prejudicar a realização dos jogos. Pessoas dos lugares mais distantes iam a
Olímpia a fim de assistir aos jogos. Havia, entretanto, proibição à
participação das mulheres, seja como esportista, seja como espectadoras.
Apesar
da autonomia política das cidades-estados, os gregos estavam unificados em
termos religiosos. Entre as divindades cultuadas estavam: Zeus (senhor dos
deuses), Hades (deus do mundo inferior), Deméter (deusa da agricultura),
Posídon (deus do mar), Afrodite (deusa do amor), Apolo (deus do sol e das
artes), Dionísio (deus do vinho), Atena (deusa da sabedoria), Artêmis (deusa da
caça e da lua), Hermes (deus das comunicações), Hera (protetora das mulheres) e
muitas outras. Além dos grandes santuários como os de Delfos, Olímpia e
Epidauro, havia os oráculos que também recebiam grandes multidões, pois lá se
acreditava receber mensagens diretamente dos deuses. Um exemplo claro estava no
Oráculo de Delfos, onde uma pitonisa (sacerdotisa do templo de Apolo) entrava
em transe e pronunciava palavras sem nexo que eram interpretadas pelos
sacerdotes, revelando o futuro dos peregrinos. Outro fato muito interessante
era a existência dos homogloditas, um pequeno povo que vivia nas áreas
litorâneas do rio mediterrâneo, eles utilizavam a argila para a construção de
estatuetas como uma oferenda aos deuses gregos, geralmente ao Dionísio, deus da
humildade e da realeza.
A
cultura da Grécia Antiga é considerada a base da cultura da civilização
ocidental. A cultura grega exerceu poderosa influência sobre os romanos, que se
encarregaram de repassá-la a diversas partes da Europa. A civilização grega
antiga teve influência na linguagem, na política, no sistema educacional, na
filosofia, na ciência, na tecnologia, na arte e na arquitetura moderna,
particularmente durante a renascença da Europa ocidental e de resto durante os
diversos reviverem neoclássicos dos séculos XVIII e XIX, na Europa e nas
Américas, embora a América Latina tenha as suas especificidades oriundas das
civilizações quíchuas, mas que não trataremos agora. Conceitos como cidadania e
democracia são gregos, ou pelo menos de pleno desenvolvimento nas mãos dos
gregos. Qualquer história da Grécia Antiga requer cautela na consulta a fontes.
Os historiadores e escritores políticos cujos trabalhos sobreviveram ao tempo
eram, em sua maioria, atenienses ou pró-atenienses, e todos os conservadores.
Por isso se conhece melhor a história de Atenas do que a história das outras
cidades; além disso, esses homens concentraram seus trabalhos mais em aspectos
políticos (e militares e diplomáticos, desdobramentos daqueles), ignorando o
que veio a se conhecer modernamente por história econômica e social.
Todo movimento, transformação ou
desenvolvimento opera-se por meio das contradições ou mediante a negação de uma
coisa - essa negação se refere à transformação das coisas. A dialética é a
negação da negação. A negação da afirmação implica negação, mas a negação da
negação implica afirmação. “Quando se nega algo, diz-se não. Ora, a negação,
por sua vez, é negada. Por isso se diz que a mudança dialética é a negação da
negação”. O processo da dupla negação engendra novas coisas ou propriedades:
uma nova forma que suprime e contém, ao mesmo tempo, as primitivas
propriedades. O ponto de partida é a tese, proposição positiva: essa proposição
se nega ou se transforma em sua contrária - a proposição que nega a primeira é
a antítese e constitui a segunda fase do processo; quando a segunda proposição,
antítese, é negada, obtém-se a terceira proposição ou síntese, que é a negação
da tese e antítese, mas por intermédio de uma proposição positiva superior - a
obtida por meio da dupla negação. A união dialética não representa uma simples
adição de propriedades de duas coisas opostas, simples mistura de contrários,
por isso seria um obstáculo ao desenvolvimento. A característica do
desenvolvimento dialético é que ele prossegue através de negações.
Para
sermos breve, teremos uma única vida a qual está oculta. Mas depois entra na
existência e separadamente, na multiplicidade das determinações, e que com graus distintos, são necessárias. E juntas
de novo, constituem um sistema. Essa representação é uma imagem da história da
filosofia. O primeiro momento era o “em si” da realização, e em si do gérmen
etc. O segundo é a existência, aquilo que resulta. Assim, o terceiro é a
identidade de ambos, mais precisamente agora o fruto da evolução, o resultado
de todo este movimento. E a isto Hegel chama abstratamente “o ser por si”. É o
“por si” do homem, do espírito mesmo. Somente o espírito chega a ser verdadeiro
por si, idêntico consigo. O que o espírito produz seu objeto, é ele mesmo. Ele
é um desembocar em seu outro. O desenvolvimento do espírito é um
desprendimento, um desdobrar-se, e por isso, ao mesmo tempo, um desafogo.
Desta
forma em seu processo de evolução não somente faz aparecer o interior
originário, exterioriza o concreto contido já no “em si”, e este concreto chega
a ser por si através dela, impulsiona-se a si mesmo a este “ser por si”. O
concreto é em si diferente, mas logo só em si, pela aptidão, pela potência,
pela possibilidade. O diferente está posto ainda em unidade, ainda não como
diferente. É em si distinto e, contudo, simples. É em si mesmo contraditório.
Posto que é através desta contradição impulsionado da aptidão, deste este interior
à qualidade, à diversidade; logo cancela a unidade e com isto faz justiça às
diferenças. Também a unidade das diferenças ainda não postas como diferentes é
impulsionada para a dissolução de si mesma. O distinto (ou diferente) vem assim
a ser atualmente, na existência. Só assim é possível definitivamente pensar a
diversidade em toda e qualquer dimensão das sociedades.
Porém
do mesmo modo que se faz justiça à unidade, pois o diferente que é posto como
tal é anulado novamente. Tem que regressar à unidade; porque a unidade do
diferente consiste em que o diferente seja um. E somente por este movimento é a
unidade verdadeiramente concreta.Enfim, ao colocar a questão da ciência nesses
termos, Heller opõe-se ao mito de sua neutralidade; para ela, a ciência é sempre
interessada, havendo interesses que dificultam e interesses que facilitam sua
tarefa de desvelar a realidade social. Uma relação consciente do pesquisador
com a genericidade, uma escolha de valores positivos, é condição necessária
(embora não suficiente) para o cumprimento, pelas ciências sociais, de sua
tarefa de “desfetichização”, um dos principais critérios, a seu ver, para
avaliar o significado de qualquer compromisso no âmbito destas ciências, após o
advento da sociedade de classes amplificado no âmbito da mundialização das
esferas das sociedades.
Ora,
entendemos que à fala pertence aquilo sobre o que se fala. A fala dá indicações
sobre algo e isso numa determinada perspectiva. A fala retira o que ela diz
como essa fala daquilo sobre que fala como tal. Na fala, enquanto processo
social de comunicação, isso é o que se torna acessível à co-presença dos outros, na maior parte das vezes, através da
verbalização da língua. O que no “apelo
da consciência” (Heidegger) constitui o referido da fala, ou seja, o
interpelado? Manifestamente a própria presença. Essa resposta é tão
indiscutível quanto indeterminada. Mesmo que o apelo tivesse uma meta tão vaga,
ele ainda seria para a presença um motivo de prestar atenção a si mesma.
Pertence à presença, no entanto, de modo essencial, que, com a abertura de seu
mundo, ela está aberta para si mesma, de tal modo que ela sempre já se
compreende. O apelo alcança a presença nesse movimento de sempre já se ter
compreendido na cotidianidade mediana das ocupações. O impessoalmente si mesmo
do ser-com com os outros é também alcançado
pelo apelo.
A
interpretação existencial da consciência deve expor um testemunho de seu poder-ser mais próprio que está sendo
na própria presença. O testemunho da consciência não é um anúncio indiferente,
mas uma “apelação apeladora” do ser e estar em dívida. O que se testemunha é,
pois “apreendido” no ouvir que compreende o apelo sem deturpações, no sentido
por ele mesmo intencionado. Apenas a compreensão do interpelar, enquanto modo
de ser da presença propicia o teor fenomenal do que é testemunhado no apelo da
consciência. Caracterizamos a compreensão própria do apelo como
querer-ter-consciência. Esse deixar o si-mesmo
mais próprio agir em si por si mesmo, em seu ser e estar em dívida, representa
do ponto de vista fenomenal, “o poder-ser próprio, testemunhado na presença”. A
sua estrutura existencial deve ser agora liberada numa exposição. Somente assim
penetraremos na constituição fundamental da propriedade da existência que se
abre na própria presença. Enfim, enquanto compreender-se no poder-ser mais próprio, “o
querer-ter-consciência é um modo de abertura da presença”. Além do compreender,
esta se constitui de disposição e fala. O compreender existenciário significa:
projetar-se para a possibilidade fática cada vez mais própria do
poder-ser-no-mundo. Poder-ser,
porém, só pode ser compreendido em existindo nessa possibilidade.
Bibliografia
geral consultada:
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Disponível em: http://espacoacademico.wordpress.com/2011/08/13/; Idem,“Prolegômenos
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Paulo: Iluminuras, 1991; MORIN, Edgar, La
connaissance de laconnaissance. Tomo III. Paris: ÉditionsduSeuil, 1986;
Idem, La complexitéhumaine. Paris:
Flammarion, 1994; entre outros.
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