Ubiracy de Souza Braga*
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* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Um assassino em série, também conhecido pelo nome em inglês, serial killer, é um tipo de criminoso de perfil psicopatológico (cf. Freud, 1972) que comete crimes com certa frequência, geralmente seguindo um modus operandi e às vezes deixando sua “assinatura”, ou “troféu”, objeto de nossa análise, como por exemplo, coleta da pele das vítimas - no caso de Ed Gein. Curiosamente, os Estados Unidos, com menos de 5% da população mundial, produziu 84% de todos os casos conhecidos de serial killers desde 1980. Muitos dos que foram capturados aparentavam ser cidadãos respeitáveis - atraentes bem sucedidos economicamente, membros ativos da comunidade - até que seus crimes foram descobertos.
A tríade Macdonald, também conhecido como a “tríade de sociopatia” representa um conjunto de três características comportamentais que estão associados com sociopata comportamental. A tríade foi identificada pela primeira vez nas pesquisas de JM Macdonald intitulada “A Ameaça de Morte”, na edição do American Journal of Psychiatry (1963). Ela apresenta ligações de crueldade contra os animais, obsessão com o atear fogo, e persistente incontinência urinária após a idade de cinco a comportamentos violentos, o comportamento particularmente homicida. Embora outros estudos não tenham encontrado ligações estatisticamente significativas entre a tríade de violência e de criminosos violentos, muitas “assassinos seriais” exibiram esses comportamentos durante a infância. Estudos posteriores sugeriram que estes comportamentos são muitas vezes produto de negligência parental, crueldade ou trauma, e que tais eventos na infância de uma pessoa podem resultar em “propensão homicida”.
Psicologicamente os seriais killers demonstram três comportamentos durante a infância, conhecidos como a “tríade MacDonald”: fazem xixi na cama, causam incêndios, e são cruéis com animais. Existem basicamente dois tipos de seriais killers: os do “tipo organizado”, sujeitos que normalmente exibem inteligência normal e conseguem se inserir bem à sociedade, são muito mais difíceis de serem presos e controlados, visto que planejam seus crimes, não costumam deixar provas e podem ter uma vida aparentemente normal com esposa/marido, filhos e emprego, muitas vezes de alto nível, podem chegar mesmo a concluir nível superior. Já os do “tipo desorganizados”, são impulsivos, não planejam seus atos, costumam usar objetos que encontram no local do crime e muitas vezes os deixam para trás deixando muitas provas (cf. Braga, 2011).
Para o que nos interessa, ao tratar o terrorista Osama Bin Laden como troféu, o presidente Barack Obama apenas reproduz em série os erros que a inteligência militar norte-americana tem cometido em crimes de guerra. Como foram amplamente noticiados soldados norte-americanos executam civis inocentes no Afeganistão e “posam com seus corpos como troféus”. O site português Visão divulgou que militares norte-americanos apareceram posando para fotos com civis mortos no Afeganistão, o que gerou uma polêmica internacional. As fotos foram publicadas pelo jornal alemão “Der Spiegel” e mostram soldados em poses vitoriosas aparentemente, junto aos corpos de civis, vítimas após ofensiva militar dos Estados Unidos. A investigação jornalística do “Der Spiegel” conta com cerca de 4 mil fotografias e vídeos acervados das quais apenas três foram publicadas.
Reprodução Der Spiegel (2011)
O Exército dos Estados Unidos investiga as atividades de suas unidades de inteligência militar envolvidas nas torturas e na morte, de prisioneiros no Iraque e Afeganistão. As investigações por maus tratos se centraram inicialmente na Polícia Militar de custódia aos presos, mas se ampliaram devido aos crescentes indícios e testemunhos do papel da inteligência militar nas ordens que levaram a esses atos de carnificina. Responsáveis da OTAN - a Revista da OTAN fala com a Missão de Ajuda das Nações Unidas no Afeganistão já compararam estas imagens aos escândalos das outras fotografias que exibiam militares americanos abusando sexualmente de prisioneiros de Abu Ghraib, no Iraque, que desencadearam uma onda de protestos anti-EUA em todo o mundo. Estas, no entanto, ameaçam tornar-se ainda mais polémicas, uma vez que mostram o resultado de assassínios deliberados de civis por uma unidade do exército que operava em Kandhar, no ano passado. A conduta da autointitulada “kill team” levou apenas 12 homens ao banco dos réus pela morte de três civis afegãos: cinco por homicídio premeditado e outros por mutilação de cadáveres, abuso de drogas, etc. O caso é ainda mais perturbador pelo fato de os soldados cortarem partes dos corpos das vítimas para exibirem como “troféus”.
No ensaio “A anatomia da destrutividade humana”, o imenso e rigoroso trabalho de Fromm (1975), um de seus últimos, apesar do inegável valor, não recebeu a devida atenção nos meios acadêmicos, talvez por ter sido publicado num momento em que a perspectiva culturalista estava deixando de ser a moda entre uma intelectualidade mais preocupada em parecer informada sobre a última novidade que vinha da França do que no valor intrínseco das obras. A tese de Freud - também defendida por Lorenz, Desmond Morris e outros “instintivistas” - que Fromm questiona, pode ser descrita assim: “a agressividade do homem, expressa no seu comportamento tal como se registra na guerra, no crime, nos conflitos pessoais e em todas as espécies de comportamentos destrutivos e sádicos, é devida a um instinto filogeneticamente programado, inato, que procura descarga e aguarda a ocasião propícia para exprimir-se”.
Essa tese chegou a encontrar larga aceitação, não devido à validade dos argumentos que a fundamentam, mas por ela facilmente poder transformar-se numa ideologia que ajuda a atenuar o medo daquilo que pode acontecer e a racionalizar o sentimento de impotência das pessoas. Fromm pergunta: “que poderia ser mais satisfatórias às pessoas que se mostram amedrontadas e sentem-se impotentes para mudar o rumo das coisas que conduzem à destruição do que uma teoria que nos assegura que a violência origina-se de nossa natureza animal, de uma ingovernável impulsão para a agressão, e que o melhor que temos a fazer, como afirma Lorenz, é compreender a lei da evolução que é o elemento responsável pela potência dessa impulsão”? (Fromm, 1975: 22).
Obra "O Narciso", do pintor Caravaggio.
Na mitologia greco-romana, Narciso ou o Auto-Admirador (Νάρκισσος), era um herói do território de Téspias, Beócia, “famoso pela sua beleza e orgulho”. Uma ninfa bela e graciosa tão jovem quanto Narciso chamada Eco e que amava o rapaz em vão. A beleza de Narciso era tão incomparável que ele pensava que era semelhante a um deus, comparável à beleza de Dionísio e Apolo. Como resultado disso, Narciso rejeitou a afeição de Eco até que esta, desesperada, definhou, deixando apenas um sussurro débil e melancólico. Para dar uma lição ao rapaz frívolo, a deusa Némesis condenou Narciso a apaixonar-se pelo seu próprio reflexo na lagoa de Eco. Encantado pela sua própria beleza, Narciso deitou-se no banco do rio e definhou, olhando-se na água e se embelezando. As ninfas construíram-lhe uma pira, mas quando foram buscar o corpo, apenas encontraram uma flor no seu lugar: o narciso, e então dai o nome narciso a flor.
A cultura hegemônica ocidental em que vivemos tendo como fulcro a imagem desde a antiguidade grega ensina-nos, de alguma forma, embora fragmentada e parcial, a anatomia e a fisiologia do corpo humano, porém, o significado científico de suas alterações, bem poucos de nós se apercebem. É notável como o foco central sobre a estrutura e funcionamento do corpo, bem como seu significado social e psicológico, se estende para além da dicotomia saúde e doença, ou seja, o corpo tem outras características, inclusive no trabalho, por exemplo. As noções de força, habilidade, agilidade, além de outras, são componentes próprios, imprescindíveis à realização da atividade e são vivenciadas individualmente. No plano psicológico, por outro lado, as implicações do conceito de “imagem” podem indicar as formas pelas quais as pessoas conceituam e tomam como experiência consciente e inconscientemente o próprio corpo e o que ocorre com ele. A imagem abrange a maneira pela qual as pessoas aprendem a integrar suas experiências corporais, pelo modo de ser, tamanho, externalidade e\ou internalidade, funções sociais e funções morais que imprimem ao seu corpo. Portanto, o corpo humano tem mais que a dimensão biológica, daí a saúde se constituir num construto multifacetado. Sua constituição se traduz por componentes biológicos, culturais, funcionais, estéticos e morais.
A série Criminal Minds da TV paga americana, mutatis mutandis, nas suas aparentes últimas temporadas, tem marcado pelos empolgantes season finales. Seus cliffhangers deixam os fãs apreensivos ao extremo até o início da temporada seguinte tendo em vista a forma como utilizam o corpo como background e troféu humanos. A fórmula é sempre a mesma: “um unsub inteligentíssimo colocando um dos membros da equipe em perigo ou prova”. Ou seja, unsub é a “designação criminalística atribuída a um sujeito que perpetra um crime e é desconhecido”.
O episódio levou a equipe a Los Angeles para ajudar a polícia local a capturar um serial killer que apavorava a cidade. Por conta de uma onda de calor que fez com que a administração pública promovesse uma série de apagões setorizados para não deixar a cidade inteira às escuras, o psicopata em questão aproveitava a escuridão momentânea para executar suas vítimas, sempre deixando uma testemunha viva. Apesar de ser um assassino impulsivo, o repugnante personagem interpretado pelo astro Tim Curry já vinha praticando seus crimes há mais de duas décadas, nunca chamando a atenção da polícia por conta das constantes mudanças de cidade.
Todavia, ao descobrir que um sobrevivente acabou por se tornar um policial de prestígio na cidade dos anjos, o “príncipe da escuridão”, apelido dado pela imprensa, decidiu voltar à cidade para terminar o que tinha começado. O unsub, então, sequestra a irmã e a filha de seu alvo, atraindo o policial e Morgan para a casa onde foram cometidos os assassinatos originais. Morgan e o policial caem na armadilha e esse último morre. O assassino, então, foge com a filha do policial, deixando Morgan e a irmã como testemunhas. O que seria um ótimo cliffhanger - aquele que estaria à beira do precipício - acabou por ser previsível e pouco emocionante. Uma, porque o assassino não era, nem de perto, dos mais inteligentes. Diferentemente do genial psicopata interpretado por C. Thomas Howell que aterrorizou a família de Hotch no início dessa temporada, o “príncipe da escuridão” certamente será capturado sem dificuldades. Outra, porque não deu pra sentir empatia com a angústia de Morgan ao ver o assassino levando a filha do policial, talvez pela canastrice de Shermar Moore, um dos menos carismáticos do elenco. Um season finale decepcionante, na medida em que essa temporada foi uma das melhores da série. Mesmo assim, Criminal Minds ainda tem crédito pelo conjunto da obra. Não é por causa de um episódio morno que deixaremos de adorar esta que é, certamente, uma das melhores procedural series que estão no ar nestes tempos.
Bibliografia geral consultada
BRAGA, Ubiracy de Souza, “Serial Killers brasileiros: origem e significado da traigoidia”. Disponível em: http://espacoacademico.wordpress.com/2011/04/13;
BIBLIA Sacra Latina ex Bíblia Sacra Vulgatae Editionis Sisti V. et Clementis VIII, Samuel Bagsterand Sons Limited, London, [s. d];
Artigo: “Soldados americanos executam civis inocentes no Afeganistão e posam com seus corpos de troféus”. Disponível em: http://www.adivivo.com.br, 22.03.2011;
Artigo: “´Troféu de caça`, um civil inocente; o militar norte-americano ria inclinado sobre o corpo e com uma mão torcia o rosto ensanguentado para as câmeras Disponível em”.: http://www.grupobeatrice.blogspot.com/2011/03/trofeu-de-caça-um-civil-inocente-o.html;
RODRIGUES, Nina, As Coletividades Anormais. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 1939;
FROMM, Erich. Anatomia da destrutividade humana. RJ: Guanabara, 1975;
FOUCAULT, Michel, Arqueologia do Saber. Petrópolis (RJ): Vozes, 1971; Idem, El Orden del Discurso. Barcelona: Tusquets, 1973; Idem, História da Sexualidade. Rio de Janeiro: Graal, 1977, 3 volumes
Idem, A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 1979;
Idem, Eu Pierre Rivière, que matei minha mãe, minha irmã e meu irmão. Rio de Janeiro: Graal, 1983
Idem, “Genealogia e Poder”. In: Microfísica do Poder. 4ª edição. Rio de Janeiro: Graal, 1984;
ARENDT, Hannah, Eichmann em Jerualém. São Paulo: Cia das Letras, 1999: Idem, A Condição Humana. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 2001; GOFFMANN,
Erving, Manicômios, Conventos e Prisões. São Paulo: Perspectiva, 1974;
NEWTON, Michael, A Enciclopédia de Serial Killers. São Paulo: Madras, 2008;
CASOY, Ilana, Serial Killer -Louco ou Cruel? São Paulo: Ediouro, 2008; GREIG, Charlotte, Serial Killers - nas mentes dos monstros. 1ª edição. São Paulo: Editora Medras, 2010;
MORANA, Hilda C. P.; STONE, Michael H.; ABDALLA-FILHO, Elias, “Transtornos de personalidade, psicopatia e serial killers”. In: Rev. Bras. Psiquiatr. 2006; 28 (Supl. II), Abril, 2011.
Entre outros....
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Entre outros....
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