O fenômeno da anti-política

Favorito para ser o campeão de votos no País, Tiririca desafia o marketing ao apostar numa campanha que faz piada com os cânones que regem as estratégias dos candidatos tradicionais e apostar na anti-politização

Robson Braga 
robsonbraga@opovo.com.br20/09/2010 02:00

De gorro colorido, peruca amarela e blusa estampada em plena propaganda eleitoral de TV, Francisco Everaldo Oliveira Silva, o palhaço Tiririca, parece desconhecer o cargo que pretende exercer a partir de 2011. Ou não. Candidato à Câmara Federal pelo PR de São Paulo, ele infringe as convenções do marketing eleitoral numa linha quase anárquica.

Ridiculariza a política e faz chacota com o nepotismo ao dizer que irá ajudar sua família caso seja eleito. Após virar assunto na imprensa nacional, Tiririca passou a receber críticas pela apologia da despolitização. Já os mais espertos se aproveitam do apelo popular do palhaço para angariar votos para si.

Não fosse o cenário característico e o horário em que é veiculada, a propaganda de Tiririca poderia ser confundida com um quadro televisivo de humor. A piada ingênua, a risada descabida e o gestual performático são os mesmos dos shows que o palhaço faz Brasil afora.

Na mais nova inserção de TV, Tiririca diz que precisou “apelar” para os pais, um casal de fantasia semelhante à dele próprio. “Todo mundo está mostrando sua família, as pessoas se comovem com família na televisão”, diz o irônico Tiririca, num momento em que estouram casos como a quebra de sigilo da filha de José Serra (PSDB) e as denúncias de favorecimento ilícito ao filho da ex-ministra da Casa Civil, Erenice Guerra.

Democracia

Não se trata, contudo, de candidatura de protesto, nem mesmo de sátira na política. “É pouco apreço à democracia”, diz Márcio Acserald, professor de Comunicação da Universidade de Fortaleza (Unifor), que tem o humor como área de estudo. Segundo ele, trata-se do mesmo desapreço democrático que levou o estilista Clodovil Hernandes (PTC-SP) à Câmara dos Deputados em 2006 e a ex-stripper Deborah Soft (PTN) à Câmara de Municipal de Fortaleza em 2004. 

“Os três têm uma mesma dinâmica: pessoas que usufruem da fama que têm para obter vantagem sobre os demais candidatos. Mas são candidaturas totalmente legítimas, desde que eles saibam o que estão fazendo lá (no legislativo)”, diz o professor. Acserald ironiza ao ser questionado se o humorista não estaria prejudicando a imagem da política. “A política não precisa dele. Eles (os políticos) já fazem um ‘bom’ trabalho sem o Tiririca. Ele apenas sinaliza alguma coisa que não vai bem”, avalia.

Em entrevista ao jornal Extra, do Rio de Janeiro, o presidente do Ibope, Carlos Augusto Montenegro, informou que Tiririca é o candidato mais citado nas consultas de intenção de voto para deputado federal em São Paulo. Os dados precisos, contudo, não podem ser divulgados, uma vez que não estão registrados na Justiça Eleitoral.

EMAIS

Candidato pelo PT ao Governo de São Paulo, Aloizio Mercadante mandou remover seu nome do pano de fundo da propaganda do humorista, que vem adotando discursos em tom jocoso. Preocupado com sua imagem, Mercadante foi além: no debate do grupo Folha em parceria com a Rede TV!, na última quarta-feira, 15, o petista explicou que não tem responsabilidade sobre a candidatura de Tiririca.

Ao contrário das preocupações do petista, Tiririca tem recebido convites para fazer gravações em prol de postulantes de outros estados. No Amazonas, a propaganda eleitoral da TV o mostra pedindo voto para Henrique Oliveira (PR), que concorre à Câmara Federal com o mesmo número do palhaço. No Ceará, o humorista está abrindo a propaganda dos candidatos a deputado estadual. “E vem mais por aí”, avisa a assessoria de imprensa do PR sobre as inúmeras gravações de estúdio que Tiririca está fazendo para candidatos de estados como Bahia e Goiás.